O Juízo no Amor

XXXIII Domingo do Tempo Comum

Estamos chegando ao final do Ano Litúrgico, nos preparando para celebrarmos Cristo Rei. A Liturgia, nestas últimas semanas, coloca diante de nós a segunda vinda do Senhor. A grande exortação do Evangelho (Lc 21,5-19) é a viver com perseverança em tempos difíceis, em tempos de provação. A perseverança é uma virtude que vai sendo forjada na fidelidade a cada dia. A perseverança vai nos amadurecendo, nos dando profundidade espiritual. O Evangelho termina nos exortando a permanecermos firmes: “É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida”. A perseverança não é vazia, ela vai nos conduzindo para o encontro com o Senhor que virá para julgar. E o julgamento é um encontro de verdade com Deus-amor e conosco mesmos diante da sua misericórdia infinita. O texto da Bula do ano Jubilar, “Spes non confundit”, faz uma bela catequese sobre o juízo. Eis o texto: “Outra realidade ligada à vida eterna é o juízo de Deus, quer no termo da nossa existência quer no fim dos tempos. Muitas vezes a arte tentou representá-lo — pensemos na obra-prima de Michelangelo, na Capela Sistina —, atendo-se à concepção teológica da época e transmitindo um sentimento de temor a quem o observa. Se é justo preparar-se com viva consciência e seriedade para o momento que recapitula a existência, ao mesmo tempo é necessário fazê-lo sempre na dimensão da esperança, virtude teologal que sustenta a vida e nos permite não cair no medo. O juízo de Deus, que é amor (cf. 1Jo 4,8.16), só poderá basear-se no amor, especialmente naquele que tivermos, ou não, praticado para com os mais necessitados, nos quais Cristo, o próprio Juiz, está presente (cf. Mt 25,31-46). Trata-se, portanto, dum juízo diferente do juízo dos homens e dos tribunais terrenos; deve ser entendido como uma relação de verdade com Deus-amor e consigo mesmo dentro do mistério insondável da misericórdia divina. A Sagrada Escritura afirma a esse respeito: ‘Tu ensinaste o teu povo que o justo deve ser amigo dos homens, e deste a teus filhos uma boa esperança, porque, após o pecado, dás a conversão (…), para que, ao sermos julgados, esperemos misericórdia” (Sab 12,19.22). Como escreveu Bento XVI, ‘no momento do Juízo, experimentamos e acolhemos este prevalecer do seu amor sobre todo o mal no mundo e em nós. A dor do amor torna-se a nossa salvação e a nossa alegria’.

“Por conseguinte, o juízo diz respeito à salvação na qual esperamos e que Jesus nos obteve com a sua morte e ressurreição. Visa abrir ao encontro definitivo com Ele. E, como em tal contexto não se pode pensar que o mal cometido permaneça oculto, o mesmo mal precisa ser purificado, para nos permitir a passagem definitiva ao amor de Deus. Compreende-se, neste sentido, a necessidade de rezar por aqueles que concluíram o caminho terreno: uma solidariedade na intercessão orante que encontra a sua eficácia na comunhão dos santos, no vínculo comum que nos une em Cristo, primogênito da criação. Assim, a Indulgência Jubilar, em virtude da oração, destina-se de modo particular a todos aqueles que nos precederam, para que obtenham plena misericórdia”. (Papa Francisco, Spes non confundit, 22).

† Cardeal Paulo Cezar Costa
Arcebispo Metropolitano de Brasília