Papa destaca que é preciso passar dos discursos ambientalistas a uma conversão ecológica

Em Castel Gandolfo, na quarta-feira, 1º de outubro, o Papa Leão XIV presidiu a abertura da Conferência Internacional Espalhando Esperança (Raising Hope), encontro que celebra os dez anos da Encíclica Laudato Si’.

Durante a “Celebração da Esperança pela Nossa Casa Comum”, o Pontífice reafirmou que a ecologia integral, proposta por Francisco em 2015, só será possível por meio de uma verdadeira conversão do coração e destacou a urgência de ações concretas diante da crise climática global.

Diante de mais de mil participantes reunidos no Centro Mariápolis, Leão XIV convidou os presentes a redescobrir a Laudato Si’ como caminho de unidade, paz e esperança. Ele agradeceu aos organizadores, conferencistas e ao Movimento Laudato Si’, que ao longo da última década promoveu a aplicação da encíclica em comunidades religiosas, dioceses, escolas, universidades e organismos internacionais.

“As preocupações e recomendações do Papa Francisco foram acolhidas não apenas pelos católicos. Muitos, inclusive fora da Igreja, sentiram-se compreendidos, representados e apoiados neste momento histórico”, afirmou o Pontífice. Para ele, a mensagem de diálogo, ecologia integral e união da família humana permanece mais atual e urgente do que nunca: “Trata-se de desafios ainda mais prementes hoje do que há dez anos. Eles exigem uma verdadeira conversão.”

Em sua reflexão, Leão XIV alertou para o perigo de reduzir o cuidado com a casa comum a uma “moda passageira” ou a um tema ideológico. Inspirando-se na exortação Laudate Deum, o Papa chamou atenção para o risco de minimizar os sinais da crise climática e de ridicularizar quem luta pela proteção do meio ambiente.

“Nas Escrituras, o coração não é apenas o centro dos sentimentos e emoções: é a sede da liberdade. […] É somente por meio de um retorno ao coração que pode acontecer também uma verdadeira conversão ecológica. É preciso passar da coleta de dados ao cuidado; de discursos ambientalistas a uma conversão ecológica que transforme o estilo de vida pessoal e comunitário”, declarou.

Para o Pontífice, essa transformação interior está profundamente ligada à fé cristã: “Não se pode amar o Deus que não se vê desprezando suas criaturas, e não se pode dizer discípulo de Jesus Cristo sem compartilhar de seu olhar sobre a criação e de seu cuidado pelo que é frágil e ferido.”

O Papa sublinhou ainda que a ecologia integral não pode ser dissociada da justiça social e do compromisso com os mais vulneráveis. “Somos uma única família, com um Pai comum; habitamos um mesmo planeta, do qual devemos cuidar juntos”, recordou.

Ao olhar para o futuro, Leão XIV destacou a importância dos próximos encontros internacionais — como a COP30, a sessão da FAO sobre segurança alimentar e a Cúpula da Água da ONU em 2026 — como oportunidades para escutar “o grito da Terra e o grito dos pobres”.

Na conclusão do discurso, o Papa fez um forte apelo à responsabilidade coletiva e pessoal: “Não podemos dar espaço à indiferença nem à resignação.” E deixou uma pergunta em aberto aos fiéis e a toda a humanidade:

“Deus nos perguntará se cultivamos e cuidamos do mundo que Ele criou, para o bem de todos e das gerações futuras, e se cuidamos de nossos irmãos e irmãs. Qual será a nossa resposta?”

Durante a cerimônia de abertura, Leão XIV abençoou um fragmento de gelo de 20 mil anos, trazido da Groenlândia pelo artista Olafur Eliasson e pelo geólogo Minik Rosing. O gesto, parte do projeto artístico Ice Watch, que já levou blocos de gelo em processo de derretimento a praças de Copenhague e Paris, simbolizou a urgência das mudanças climáticas e a necessidade de ação imediata.

A ministra do Meio Ambiente e Mudança Climática do Brasil, Marina Silva, relacionou os dez anos da Laudato Si’ ao aniversário do Acordo de Paris e fez um apelo por coerência entre promessas e ações. Ela denunciou os trilhões ainda investidos em combustíveis fósseis e defendeu “uma transição justa, ordenada e equitativa” para energias limpas.

A ministra também renovou o convite ao Papa para participar da COP30, em 2026, em Belém:

“Sua presença poderá transformar a COP30 na COP da esperança, decisiva para a implementação dos compromissos e para a preservação de todas as formas de vida que enriquecem o jardim da Criação.”

Marina Silva concluiu com um chamado à ética: “Já temos as respostas técnicas. O que falta é o compromisso ético de usar o conhecimento em favor do combate à mudança do clima e da desigualdade. É incoerente dizer que amamos o Criador e destruímos a criação.”

O ex-governador da Califórnia, Arnold Schwarzenegger, destacou os avanços obtidos no estado — como a redução de 25% nas emissões de gases de efeito estufa e a instalação de um milhão de telhados solares — e lembrou que “a energia limpa não é inimiga da prosperidade, mas motor do crescimento”. Dirigindo-se aos líderes religiosos, disse: “Vocês estão mais próximos do povo do que qualquer governo. Lembrem às pessoas que a poluição é uma questão de saúde e de justiça.”

Também participou Yeb Saño, presidente do Conselho do Movimento Laudato Si’, que reforçou o apelo à responsabilidade ética e à unidade global diante da crise climática.

A Conferência Espalhando Esperança, organizada pelo Movimento Laudato Si’ em colaboração com o Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral, Caritas Internationalis, CIDSE, UISG, Movimento dos Focolares e Ecclesial Networks Alliance, segue até 3 de outubro e reúne representantes de diversos países em torno do compromisso comum de cuidar da casa comum e garantir um futuro sustentável para as próximas gerações.

Com foto e informações da CNBB.