Peregrinos Rumo à Liberdade

Quarta-Feira de Cinzas

Convido cada católico a viver esta quaresma na perspectiva do ano jubilar como “Peregrinos da Esperança”. Proponho que a imagem do peregrino nos acompanhe neste caminho quaresmal. A palavra peregrino é usada para definir alguém que caminha, mas é usada, principalmente, para definir uma caminhada religiosa. Por isso, o peregrino é alguém que caminha para um santuário, para um lugar religioso. A imagem do peregrino relembra a nossa condição humana de peregrinos rumo ao eterno, rumo ao absoluto de Deus, revela a nossa condição humana de caminhantes. Desde as origens e não só no cristianismo, mas nas grandes religiões, tem-se a experiência da peregrinação. A Escritura narra grandes peregrinações: Abraão peregrinou, Moisés peregrinou, Israel peregrinou rumo à terra prometida, Jesus peregrinou a Jerusalém e era um mestre itinerante, os primeiros discípulos foram peregrinos para o anúncio do Evangelho. Paulo peregrinou fazendo com que o Evangelho saísse de Antioquia na Síria e chegasse até o centro do mundo político de então, Roma. A peregrinação nos une aos nossos antepassados na experiência da fé, na percepção de que a fé é um grande caminho que nos coloca na condição de peregrinos rumo ao Infinito, diante do qual somos sempre mendigos. O peregrino leva consigo somente o essencial, deixa para trás tantas coisas que vão nos escravizando. O mais essencial desta peregrinação é Deus, o seu amor.

Se a peregrinação faz parte da história do Povo de Deus, neste tempo quaresmal somos chamados a nos inspirarmos na peregrinação de Israel da escravidão para a liberdade. Israel deixa o Egito rumo à terra da promessa. Israel faz a experiência de Deus, que faz sair da escravidão para a liberdade: “Eu sou o Senhor teu Deus, que te fez sair da terra do Egito, da terra da servidão” (Ex 20,2). O Egito relembra a vida escrava, relembra a escravidão do pecado, de tantas coisas que nos afastam de Deus, que precisam de conversão. Deus é aquele que nos faz passar da escravidão para a verdadeira liberdade, para a liberdade de filhos e filhas de Deus. O filho pródigo (Lc 15,11-32) sai da casa do Pai, quer se aventurar na vida livre. Pensa que a liberdade está fora da casa do Pai. Talvez esta parábola seja muito moderna, pois o ser humano, hoje, anseia por liberdade, mas contrapõe a casa do Pai à vida livre, não percebendo que se pode ser verdadeiramente livre na casa do Pai, pois a casa do Pai é a casa da liberdade. A verdadeira liberdade é crescer para o Bem. Nós somos verdadeiramente livres quando crescemos para Deus, que é o Bem absoluto da nossa vida.

Neste nosso peregrinar quaresmal, a Igreja nos propõe a esmola, a oração e o jejum como companheiros (Mt 6,1-6.16-18). A esmola nos instiga à caridade, a nos perguntarmos pela caridade na nossa vida. No Brasil, temos a Campanha da Fraternidade: Fraternidade e Ecologia Integral. “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). A oração é um diálogo amoroso com Deus, que vai aquecendo o nosso coração na caminhada. O jejum relembra-nos, sempre, a liberdade diante das realidades deste mundo. Sejamos peregrinos, nesta quaresma, buscando trilhar o caminho da escravidão para a liberdade. Boa quaresma para todos nós.

Dom Paulo Cezar Costa
Arcebispo de Brasília