Desde o início da história humana, a criatividade e o engenho permitiram superar limites, criar e modelar novas realidades. O mundo contemporâneo testemunhou esses avanços por meio da tecnologia e da engenharia. Ir além dos limites sempre fez parte da nossa identidade como cocriadores de Deus, impulsionando-nos a descobrir novas possibilidades. Contudo, em um tempo marcado por desequilíbrios ecológicos — na Terra, nos seres vivos e na vida humana — os limites adquiriram um novo significado, que precisou ser redescoberto.
Em geral, as limitações, muitas vezes associadas a algo negativo por parecerem restringir a liberdade, não anularam as possibilidades, mas suscitaram outras. No mundo romano, o termo limes, limitis designava fronteiras e margens, indicando um caminho que assinalava um confim, mas não um muro — uma orientação sobre onde começar e terminar.
As limitações trouxeram consigo um senso importante de suficiência, acolhimento e aceitação. Diante dos limites, foi possível contemplar o que transcende; ao reconhecer a própria vulnerabilidade, o ser humano entendeu o quanto o ultrapassa. Assim, ao perceber a realidade como ela é, novas decisões puderam ser tomadas, a criatividade renasceu e novos caminhos surgiram. No entanto, as sociedades modernas tornaram-se obcecadas não apenas em superar limites, mas em eliminá-los. Nada pareceu suficiente: crescimento, velocidade, consumo material e digital, jornadas de trabalho cada vez maiores. Quanto mais se soube, menos se soube, e a rejeição aos limites continuou. Criou-se até a ilusão de que ciência e tecnologia poderiam resolver todas as dimensões da existência — até a morte — tornando-se fonte de vida e significado. Paradoxalmente, isso restringiu a liberdade e o desenvolvimento humano integral.
O Jubileu daquele ano funcionou como um caminho traçado na terra, indicando onde começar e onde terminar; uma linha de fronteira que abriu uma oportunidade de libertação, renovação e descanso. Revelou-se como um limite capaz de encerrar práticas que não deveriam continuar: desigualdades, pobreza, guerras, esgotamento de recursos. Mostrou-se, ainda, como um convite a redescobrir o valor dos limites enquanto caminho para a liberdade, reconhecimento do essencial e impulso para uma “Economia do Suficiente” — uma economia orientada ao bem comum, ao surgimento da esperança e à abertura de novos horizontes. Tratou-se de uma proposta econômica que reconhece limites capazes de salvaguardar a justiça para todos os seres vivos.
Assim, não se tratou apenas de repensar crescimento e recursos ou de limitar acúmulos de riqueza, poder ou desigualdades. Os limites não foram apenas materiais ou técnicos, mas sobretudo humanos e espirituais — um convite a repensar todos os relacionamentos.
Ao buscar retomar a economia no contexto jubilar, o encontro também levou a refletir sobre a necessidade de reconciliar a relação do ser humano com Deus e com a Terra. Somos criaturas limitadas, profundamente amadas, mas limitadas. Não criamos o mundo; ele nos foi dado como dom por Deus, para que dele cuidássemos e frutificássemos. Ao enxergá-lo como mero objeto de exploração, continuamos a explorá-lo sem cessar — inclusive as pessoas. Foi necessário redescobrir o mundo como um lar vivo, ao qual pertencemos. A partir dessa consciência, reconhecendo nossos limites, desenvolveu-se uma atitude mais profunda de responsabilidade e zelo, capaz de gerar relações mais saudáveis com os outros e consigo mesmo.
Uma “Economia do Suficiente” poderia abrir caminhos para um estilo de vida mais simples, baseado no compartilhamento e na compreensão de que nem nós nem os outros somos definidos por bens materiais, mas pelo que somos. Não significou viver pior ou com menos felicidade, mas viver com gratidão e libertar-se da ideia de insuficiência permanente, tornando-nos guardiões uns dos outros. Essa economia convidou a dar tempo e espaço ao que realmente importa, como um abraço — um limite que se tornou experiência concreta de amor.
O Jubileu exigiu aquilo que nem sempre pareceu possível — perdão, libertação — e, no entanto, mostrou que tais práticas poderiam tornar-se mais frequentes. Propôs a visão de uma economia capaz de recomeçar e transformar-se não em espaço de competição, desejo insaciável ou esgotamento, mas em ambiente marcado por limites saudáveis, que favorecem o florescimento, o descanso, a contemplação da beleza e bons relacionamentos.
À medida que o Ano Jubilar se aproximou do fim, emergiu o convite para redescobrir os limites pessoais, da Terra e da economia, que não terminaram com o Jubileu, mas se fortaleceram. Diante disso, permaneceu a pergunta essencial: de quais limites nossas vidas precisaram hoje?
Com foto e informações do Vatican News.